CAP 4 - "O RASTO DE SANGUE"
CAPÍTULO III
1400 ! 1600 A. D.
- Os séculos 15o ,16o e 17o são dentre todos os mais acidentados na história do mundo, e especialmente na história do Cristianismo. Houve uma quase que continua revolução dentro da Igreja Católica - tanto na Grega como na Romana - procurando uma reforma. Este despertar das consciências há muito adormecidas, o desejo de uma reforma genuína, começou realmente no século 13, ou possivelmente, um pouco antes. A História certamente parece indicar isto.
- Voltemos um pouco. A Igreja Católica por seus muitos desvios do Novo Testamento, suas muitas estranhas e cruéis leis e por seu estado moral desesperadamente decaído e suas mãos e roupas manchadas com o sangue de milhões de mártires, tomou-se repreensível e dolorosamente repulsiva a muitos dos seus próprios adeptos, que eram muito melhores que seus próprios sistemas, leis, doutrinas e práticas. Vários de seus mais destemidos, melhores e mais espirituais sacerdotes e demais líderes, um por um, procuraram sinceramente reformar muitas de suas mais censuráveis leis e doutrinas e fazê-la voltar, o quanto antes, ao nível dos ensinos do Novo Testamento. Vamos dar alguns exemplos indiscutíveis. Notemos, não somente onde e quando começa e até que ponto vai o fogo da reforma, mas notemos também os seus lideres. Os lideres eram, ou tinham sido, todos sacerdotes católicos ou oficiais do clero. Havia, portanto, um pouco de bom entre o muito mal. Contudo, por esse tempo, provavelmente não havia nenhuma única doutrina do Novo Testamento observada?sua pureza original - mas notemos agora alguns reformadores e onde trabalhavam.
- É bom observar, todavia, que nos vários séculos anteriores a esse grande período de reforma, havia um número de importantes caracteres que se rebelaram contra os terríveis excessos do catolicismo e sinceramente procuraram permanecer leais à Bíblia - mas um rasto de sangue foi tudo o que deles ficou. Vamos estudar, por um momento, o período mais importante - o da Reforma.
- De 1320 a 1384 viveu na Inglaterra um homem que atraiu a atenção de todo o mundo. Seu nome era João Wycliff. Foi ele o primeiro dos destemidos que tiveram a coragem de intentar uma real reforma dentro da Igreja Católica. A História refere-se a ele varias vezes, como a "Estrela d'Alva da Reforma". Viveu uma vida sincera e frutífera. Precisaríamos, sem dúvida, escrever vários volumes para contar de algum modo a historia de João Wycliff. Ele foi odiado, terrivelmente odiado, pelos lideres da hierarquia. Sua vida foi persistentemente buscada. Finalmente morreu paralítico. Anos depois, era tão grande o ódio católico para com ele, que seus ossos foram desenterrados, queimados e as cinzas lançados às águas.
- Seguindo bem de perto as pegadas de Wycliff veio João Huss, 1373-1415, um distinto filho da longínqua Boêmia. Sua alma correspondeu ao sentimento da brilhante luz da "Estrela d'Alva da Reforma". Sua vida foi destemida e cheia de eventos, mas dolorosa e miseravelmente curta. Ao invés de despertar um ambiente favorável a uma verdadeira reforma entre os católicos, ele despertou medo, aversão e oposição, que resultaram na sua morte amarrado a um poste e queimado - um mártir entre os seus. Todavia, ele procurou o bem de seu próprio povo. Amou o seu Senhor e o seu povo. Todavia, ele foi apenas um entre os milhões que morreram por essa causa.
- Depois de João Huss da Boêmia, veio um maravilhoso filho da Itália, o mui eloqüenteSavanarola,. 1452-1498. Huss foi queimado em 1415 e Savanarola nasceu 37 anos depois. Ele como Huss, ainda que católico devoto, encontrou os lideres de seu povo - povo da Itália - como os da Boêmia, contrários a qualquer reforma. Mas por sua eloqüência poderosa, foi bem sucedido no despertar de algumas consciências e assegurou um considerável número de seguidores. Uma reforma real, porém, na hierarquia significava ruína absoluta para os superiores desta organização. Assim, Savanarola, tão bom quanto Huss, devia morrer. E também ele foi amarrado num poste e queimado. Dos homens eloqüentes desse grande período, Savanarola, possivelmente, a todos suplantava. Não obstante lutava contra uma organização poderosa e sua « existência reclama que combatessem a reforma, e desta forma Savanarola devia morrer.
- Naturalmente, muitos nomes de reformadores desse período têm sido deixados. Só os mais proeminentes na História são aqui mencionados. Seguindo a Savanarola, a "voz de ouro da Itália", vem um líder da Suíça. Zwingli nasceu antes da morte de Savanarola. Viveu de 1484 a 1531. O espírito da Reforma alastrava por toda a terra. Seu fogo abria caminho e espalhando-se muito rapidamente, tornou difícil refreá-lo. O fogo ateado por Zwingli não tinha sido senão parcialmente sufocado e já um mais sério que todos os outros irrompera na Alemanha. Zwingli morreu na batalha.
- Martinho Lutero - provavelmente o mais importante de todos os reformadores do 15o e 16o séculos, viveu de 1483 a 1546, e como se pode ver pelas datas era quase contemporâneo de Zwingli. Nasceu 1 ano antes de Zwingli e viveu 15 anos mais. Seus grandes predecessores tornaram-lhes mais fácil o caminho que devera trilhar, talvez muito mais do que encontramos registrado na História. Além disso, Lutero aprendeu pela dura experiência deles, bem como das que ele próprio teve mais tarde, que uma verdadeira reforma no seio da Igreja Católica seria claramente impossível. Assim mesmo, muitas .medidas reformatórias seriam necessárias. Uma exigia outra e outras exigiam ainda outras e assim por diante.
- Assim, Martinho Lutero, depois de ter tido muitas e difíceis batalhas com os líderes do Catolicismo foi auxiliado por Melancton e outros proeminentes alemães, tornando-se em cerca de 1530 o fundador de uma organização cristã inteiramente nova, agora conhecida por Igreja Luterana, que se tornaria em breve a Igreja da Alemanha. Esta foi a 1a das novas organizações a sair diretamente de Roma, renunciando toda lealdade à Igreja Mãe (como é chamada) para continuar a viver.
- Deixando por um pouco a Igreja da Inglaterra, que teve seu começo logo depois da luterana, seguiremos a Reforma no continente. De 1509 a 1564 viveu outro dos maiores reformadores. Era João Calvino, um francês, mas que parecia ao mesmo tempo ter vivido na Suíça. Era um homem realmente poderoso. Foi contemporâneo de Martinho Lutero por 30 anos, e tinha 22 anos quando Zwingli morreu. Calvino é apontado como fundador da Igreja Presbiteriana. Alguns historiadores, contudo, admitem Zwingli se bem que as mais fortes evidências favoreçam a Calvino. Indiscutivelmente o trabalho de Zwingli, tanto quanto o de Lutero, tornou muito mais fácil o trabalho de Calvino. Data de 1541, exatamente 11 anos (parece ser esse ano) depois da fundação da Igreja Luterana por Lutero, o início da Igreja Presbiteriana. Esta igreja, como no caso do Luteranismo, foi conduzida por um sacerdote ou oficial, que era católico reformado. Este seis - Wycliff, Huss, Savanarola, Zwingli, Lutero e Calvino, grandes líderes em suas batalhas para a reforma, feriram o catolicismo até o tornar cambaleante.
- Em 1560, 19 anos depois da 1a organização Calvinista em Genebra, Suíça, João Knox, discípulo de Calvino, estabeleceu a 1a Igreja Presbiteriana na Escócia, e justamente 32 anos depois, em 1592, o Presbiterianismo tornou-se ali a religião de Estado.
- Durante todas essas difíceis lutas da Reforma, contínuo e valoroso auxílio foi dado aos Reformadores por muitos anabatistas, ou qualquer outro nome que levavam. Esperando algum alívio para sua dura sorte, eles saíram de seus esconderijos e lutaram corajosamente com os reformadores; todavia, eles estavam condenados a um medonho desapontamento. Haviam de ter, desde então, mais dois inimigos a persegui-los. Tanto a Igreja Luterana como a Presbiteriana trouxeram da sua mãe, a igreja Católica, muitos de seus males, entre os quais a idéia de uma Igreja do Estado. Ambas tornaram-se igrejas ligadas ao Estado. Ambas tomaram gosto na perseguição, faltando pouco, se alguma coisa faltava, para igualar-se à Mãe Católica.
"O RASTO DE SANGUE"
Triste e medonho era o destino desses grandes sofredor", os Anabatistas. O mundo de então não oferecia sequer um lugar onde eles se pudessem esconder. Quatro temíveis perseguidores estão agora furiosos em seu rasto. Na verdade seu caminho era um Rasto de Sangue .
- Durante o mesmo período, em realidade vários anos antes que os Presbiterianos, levantou-se mais uma nova denominação, não no continente, mas na Inglaterra. Contudo, ela surgiu não tanto como Reforma (ainda que evidentemente a facilitasse) mas como conseqüência de verdadeira divisão ou cisão nas fileiras católicas. Semelhante à divisão em 869, quando os católicos do Leste separaram-se dos do Oeste e se tornaram conhecidos na História como Igrejas Católicas Grega e Romana. Esta nova divisão surgiu mais ou menos assim.
Henrique VIII, rei da Inglaterra, casou-se com Catarina da Espanha. Infelizmente, depois de algum tempo, surgiram algumas dificuldades amorosas, porquanto ele se apaixonara por Ana Bolena. Por isso Henrique queria divorciar-se de Catarina e casar-se com Ana. Obter o divórcio naquele tempo não era coisa fácil. Somente o Papa poderia concedê-lo e, nesse caso, por razões especiais, o recusou. Henrique ficou num grande apuro. Sendo rei, sentiu que devia ter autoridade para seguir sua própria vontade no assunto . Seu 1oministro (a esse tempo Thomas Cromwell) chegou a zombar do rei. Por que se submete à autoridade papal em tais questões? Henrique seguiu a sua sugestão, retirou-se de sob a autoridade do Papa e fez-se chefe da Igreja da Inglaterra. Começa, desse modo, a nova Igreja da Inglaterra. Isto se consumou em 1534 ou 1535. Nesse ocasião não houve mudança na doutrina, mas simplesmente, uma renúncia à autoridade papal. Henrique nunca se tornou realmente protestante de coração. Morreu na fé católica.
- Esse rompimento, finalmente, resultou em várias e consideráveis mudanças, ou reformas. Uma reforma dentro da Igreja Católica e sob a autoridade papal, como no caso de Lutero e outros tinha sido impossível até então, mas tornou-se possível depois desta divisão. Granmer, Latimer, Ridley e outros realizaram algumas notáveis mudanças. Contudo, eles e muitos outros pagaram o preço de sangue por tais mudanças, pois poucos anos mais tarde, Maria, "Maria Sanguinária", uma filha da divorciada Catarina, subiu ao trono da Inglaterra e levou a nova igreja a submeter-se ao domínio papal, novamente. Esta temível e terrível reação terminou com os tenazes e sanguinários 5 anos do seu reinado. Enquanto as cabeças caíam de sob o sanguinário machado de Maria, a sua acompanhou-as. O povo havia adquirido, no entanto, um pouco de gosto pela liberdade, e então, quando Elizabete, a filha de Ana Bolena, tornou-se rainha, a Igreja da Inglaterra novamente renunciou o poder do papa e foi restabelecida.
- Desse modo, antes de findar o século 162, havia já 5 igrejas estabelecidas - igrejas oficializadas pelos governos civis: Católica Romana e Grega, contadas como duas; depois a Igreja da Inglaterra; a Luterana ou da Alemanha; e a Igreja da Escócia, agora conhecida como Presbiteriana. Todas elas foram pródigas em seu ódio e perseguição aos povos chamados Anabatistas, Waldenses e outras igrejas separadas do Estado, igrejas que nunca, de modo algum haviam tido relação com a Igreja Católica. O grande auxílio dos Anabatistas nas pelejas em prol da Reforma foi esquecido ou estava sendo então totalmente ignorado. Milhares deles, incluindo mulheres e crianças, pereciam cada dia, como resultado de intermináveis perseguições. A grande esperança despertada e inspirada pela Reforma transformou-se em uma sangrenta desilusão. O remanescente deles encontrou um incerto refúgio nos Alpes amigos e em outros lugares escondidos do mundo.
- Essas 3 novas organizações, separadas ou saídas da Igreja Católica, retiveram muitos dos seus erros mais prejudiciais entre os quais os seguintes:
- governo eclesiástico da Igreja (diferente na forma).
- Igreja oficializada (Igreja e Estado unidos).
- Batismo infantil.
- Batismo por aspersão ou ablução.
- Regeneração batismal (algumas pelo menos, e outras, se muitos dos seus historiadores podem ser acreditados).
- Perseguições (ao menos por alguns séculos).
- No começo todas essas Igrejas oficializadas perseguiram urna às outras, bem como às demais, até que num concílio realizado em Augsburgo em 1555, um tratado de paz, conhecido como a "Paz de Augsburgo" foi assinado entre católicos de um lado e luteranos de outro, concordando em não se perseguirem mais. Deixem-nos sós e nós os deixaremos sós também. Para os católicos, o lutar contra os luteranos significava guerra com a Alemanha, e para os luteranos, lutar ou perseguir os católicos significava guerra com todos os países onde o catolicismo predominava.
"O RASTO DE SANGUE"
- Mas as perseguições não cessaram. Os odiados Anabatistas (hoje chamados batistas) a despeito de todas as perseguições anteriores, e a despeito do terrível fato de que 50 milhões já haviam sido martirizados, ainda existiam em grande número. Foi nesse mesmo período que ao longo de uma só estrada n a Europa, numa distancia de 56 quilômetros, encontravam-se de espaço em espaço, postes pontiagudos, no topo dos quais era colocada uma cabeça ensangüentada de um mártir Anabatista. A imaginação humana não pode retratar uma cena tão terrível. E ainda uma coisa perpetrada, de acordo com a história verossímil, por um povo que se chamava devoto seguidor do meigo e humilde Jesus Cristo
- Lembremo-nos que os católicos não consideram a Bíblia como a única regra de fé e prática. Eles a admitem como verdadeiramente infalível, mas há duas outras coisas igualmente certas para eles: os "Escritos dos Pais" e os decretos da Igreja (Igreja Católica) ou as declarações infalíveis do Papa.
Desse modo, nunca poderia haver um debate satisfatório entre católicos e protestantes, ou entre católicos e batistas, como também nunca seria possível haver uma base de acordo final. A Bíblia, para os católicos não pode sozinha decidir coisa alguma.
- Tomemos corno exemplo a questão do "Batismo" e autoridade final para o ato e para aforma. Eles admitem que a Bíblia indiscutivelmente ensina o batismo e que Ela ensina aimersão como única forma. Mas entendem ao mesmo tempo que a infalível Igreja teve perfeito direito de mudar a forma de imersão para aspersão, mas que os outros não têm esse direito ou autoridade que pertence somente à autoridade infalível do Papa.
- O leitor estará notando por certo, e com surpresa talvez, que eu esteja fazendo muito poucas citações. Estou esforçando deveras por dar aos leitores em pequeno espaço o que houve de importante e essencial em 20 séculos de história religiosa.
- Cabe justamente aqui uma palavra com referência à Bíblia, durante esses séculos tenebrosos. Lembremo-nos que a Bíblia não era ainda impressa e mesmo não havia papel onde pudesse ser escrita, ainda mesmo que a imprensa tivesse sido inventada. O material usado para escrever constava de pergaminhos, que era extraído de peles de cabras ou de carneiros, e papiros, que constava de polpas te algumas espécies de madeira. Assim, para se imprimir um livro do tamanho da Bíblia nesse material em caracteres de punho escritos com estiletes em lugar de penas (como usamos hoje) seria por certo um enorme volume, talvez maior do que o que algum homem pudesse carregar. Não havia, então, mais do que 30 Bíblias completas em todo o mundo. Eram encontradas muitas porções ou livros da Bíblia, como Mateus, Marcos, Lucas, João, Atos ou algumas das Epístolas ou Apocalipse ou mesmo livros do Velho Testamento. Sem dúvida que um dos maiores milagres em toda a história do mundo - segundo o meu modo de pensar - é a união de pensamento e crença do povo de Deus, no que respeita aos princípios essenciais e vitais do Cristianismo. Naturalmente, que a única explicação para isso está em Deus. Isto nos faz sentir agora como é glorioso o fato de possuirmos um exemplar completo da Bíblia, cada uma na sua própria língua.
- Seria igualmente proveitoso que pensássemos de um modo especial, sobre um outro fato vital em relação à Bíblia. Ele já foi ligeiramente mencionado em capitulo anterior a este, mas é de tal maneira vital que julgamos prudente repeti-lo aqui. Referimo-nos à atitude tomada pelos católicos no concilio de Toulose, realizado em 1229 A.D., quando decidiram recusar a Bíblia, a Palavra de Deus, aos "leigos", que constituíam a vasta maioria dos católicos. Estou apresentando aqui exatamente o que eles decidiram no seu grande concílio. Recentemente um católico disse-me em particular: "Nosso propósito nisto éimpedir a interpretação particular dela". Não é realmente interessante, que Deus tenha escrito um livro para o povo, mas que o tenha feito de tal maneira que ao próprio povo seja vedado le-lo: E, ainda mais, sabendo-se que no dia do juízo a justificação ou condenação do povo será baseada na obediência aos ensinos desse livro. Não se maravilhe, pois, da declaração contida no livro: "Examinais as Escrituras porque vós cuidais ter nelas a vida eterna e são elas que de mim testificam. João 5:39). Tremenda é a responsabilidade assumida pelos católicos.
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